terça-feira, 2 de abril de 2013

Reacomodando uma nova marca

Um dia ficou um vácuo ininteligível. Ela procurou alguma resposta, mas a máxima de seu mestre budista de que a vida não tem sentido se fez mais forte. Sentiu como se estivesse antecipando a tatuagem imaginada e a procurava no corpo tentando se habituar àquela nova marca que só ela notava. Se encontrasse, passaria a mão, talvez reconhecesse sua razão de estar ali. Mas levou um tempo para entender que era interna. Estava marcada a fogo, suor e água salgada, mas só ela percebia. Tocou o barco. Numa noite descompromissada procurou um olhar novo, mas foi o outro que sorriu para sua primeira saída do casulo em que ensaiava lamber suas próprias marcas. Riu feito na infância e ainda compartilhou com a parceira de sempre. Pode ser forte mais tarde para carregar a dor dela no colo. O novo talho tenta sobressaltar, mas despista colocando ideia por ideia por ordem de chegada e pondo uma por uma para voar. Obrigações, necessidades e sobrevivência deixam qualquer ensaio de mal estar falando sozinho. Indo para onde pratica "textoterapia", tem uma ideia, de uma proposta que a falta de juízo queria fazer, mas a retração alheia não escutou. Só tinha dúvida de como resolveria o conflito dramático essencial a qualquer roteiro que se preze e foi gestando... Cervejas mais tarde com a companheira das letras, não pode mais segurar, que criação "encroada" urge feito febre de leite empedrado. Foi encaixando às linhas, acolhendo aquele barulho do lápis no papel e no final, a personagem não se rendia, escolhia a liberdade. Como decerto ela também faria. Noutro dia cedinho, andando com o cachorro e se processando mal estar externo, entendeu que a nova marca viraria uma parte que a faria melhor, sabendo que não se apressa o curso do rio, nem da vida. Quis acelerar o passo para conferir se o vizinho que andava à frente era mesmo tão interessante quanto parecia, mas estancou, só por se perceber viva. Pulsando. Voltou cantando de uma sabatina, um colega quis emprestar parte da felicidade dela, por estar triste, que felicidade? Como no filme de Arnaldo Jabor, não acreditava que ninguém fosse feliz, com sorte botava fé na alegria. Doou um pouco, mas deu a receita de teatralizar o que queria sentir, também não tinha chegado lá. No fim do dia teve dose dupla de tratamento no incômodo e pela primeira vez num longo e tenebroso inverno, a perceberam neutra. Devia então ser grata por sair da zona de conforto e se ver quase em equilíbrio, longe dos extremos aos quais tinha se mal acostumado? Provavelmente. Ainda vai virar uma das marcas internas mais cheia de nuances.

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