sábado, 24 de novembro de 2012

Voltando ao movimento das senzalas

O batuque do Paulo Eduardo Silva, do Maria Sol, no Sesc São Caetano nesta sexta já colocava naturalmente o corpo numa ginga ancestral. Mas a didática de Kiusam de Oliveira foi libertando nossos músculos, que inconscientemente ainda estavam cativos. Desde tempos imemoriais? O desafio era sair da postura eurocêntrica, a que nos ensinaram como ideal e experimentar os braços quase como asas, depois as pernas meio que na diagonal e os pés, estes reafirmando que sim, esta terra é mais do que nossa e esta é a corporeidade na qual ficamos praticamente "em casa", num cansaço bom de sentir ao fim da noite.
Entre rodas e trombadas, fomos construindo coletivamente uma gestualidade do grupo, sem certos ou errados, mas com identidade afro brasileira e mais genuína que nunca. Nada de por reparo na dança alheia, cada uma é legítima à sua maneira e vem se libertando como pode, como consegue, como dá. Às vezes em suaves prestações. Às vezes, no susto, de sopetão.
Foi simbólico na semana do orgulho negro, em que desconfio que minha predileção tenha mais a ver com uma quase birra "aborrescente" de alfinetar o pai com minha suposta preferência no âmago do racismo inconfesso dele, que tenha de repente me sentido tratada quanto as escravas da senzala pelos senhores da casa grande (claro que guardadas as devidas proporções, por elas terem teoricamente menos escolha), quando subitamente o cheiro que me eriçava tenha começado a chegar mais neutro no meu nariz. Ouço a professora dizer que tinha "quequê", um certo charme no balanço do quadril, dias depois de sentir que ele rebolava sim na aula de dança tribal, apesar de uma preparadora vocal ter me mandado "descabaçar" para um papel de prostituta três anos atrás.
Encerramos brincando com esta, que é a música original de uma brincadeira ligeiramente diferente na infância e descobrindo que foi adulterada para tornar o corpo mais contido e o negro mais subjugado: "guerreiros Nagô jogavam caxangá. Gira, salta, deixa Canjerê ficar. Guerreiros com guerreiros fazem zigue zigue zá" e o verso final era uma deixa e um acobertamento para a fuga.
P.S.: relevem os erros entendidos em afro assuntos de plantão, pois no Google não consta a grafia correta de nossa história, agora "contada de baixo".

3 comentários:

  1. Olá. Descobri somente hoje esse seu texto!!! Parabéns! Que delícia lê-lo. Obrigada.

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  2. Ah, acabei de compartilhar na minha página do Facebook. Beijo e obrigada.

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  3. Olá....adorei saber sobre os guerreiros nago. Gostaria de saber aonde buscou essa história para que poder por no meu trabalho sobre escravos de Jó

    Obrigada juliana.sp73@hotmail.com

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