segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Sangria desatada

Quando desaguei a alegria
e a reincidência dela ser maior que o juízo
Estranhamente quis criar um rio salgado
nas condições e temperaturas nada favoráveis
Me refugiei entre a tinta e as lembranças
Ao me reencantar com a vida
a partir do olhar que descobre o mundo
Me embalei no colo daqueles que me acolhem
mas banhei o rosto com dores de criança ferida
Só quando me vi esvair
a fertilidade que já semeou a terra
Acolhi minha tenda da lua
e ela pode ter vindo ying
e ainda assim implacável
me fez revirar o baú de recordações
E ser grata pelo cartão vermelho
ganho em meu mais marcante ritual de passagem
A memória apagou colegas que evaporaram
o peito aqueceu com as linhas de avós, primos e amigos
A mochileira que dorme em mim
quis fazer as malas namorando cartões postais
Um vácuo deixa incompreensível
amigas que sumiram no limbo
E num ímpeto wicca inexplicável mas sábio
improviso uma fogueira
do que estava fora de lugar naquele ninho
de amizades, confissões e consolos retrôs
Na manhã seguinte, cinzas desta passagem
polvilhavam a cozinha, palco da alquimia
E na véspera, o esfacelar da foto hipnotizou
como um incêndio de formigueiro emocional
Realinhando o eixo
para a manhã seguinte de acolher dores

Deja Vu no Bardo

Temos a mesma matéria prima
mas já me deixo levar pelo caos criativo
e você ainda rema conta a maré
do quanto Deus é disléxico
mas já vivenciei que no coração está tudo certo
És incapaz de te livrar
do labirinto sem saída que tua mente criou
E em dias de maior ebulição
fica arredio até com o carinho súbito
Já eu, ponho a mente na árvore
e tiro meu corpo para apenas dançar
E venha de onde vier
a extrapolação amorosa
eu acolho e interajo, em completa gratidão
Meu grande sertão de Guimarães Rosa
é passar a vida tentando descobrir
como te amar
E meu mergulho em carvena
escura e claustrofóbica
É que eu não descubra a tempo
de me redimir com o que em você
espelha o que ainda não coloquei sob o holofote
nem sublimei com figurino
Que eu não reensaie no palco da vida
nossos respingos de solda

sábado, 26 de janeiro de 2013

Desconcertante

Você me deixa com mais espaço na cama e ainda assim não consigo dormir. Parece que o corpo carece de um aperto consentido. Estico os pés, mas suas pernas não estão mais lá. O travesseiro é de novo todo meu e ainda assim falta um pedaço. O quarto ganha proporções exageradas e entrego os pontos levantando.
No banheiro, teu cheiro se impõe, soberano, a ponto de esquecer se ia escovar os dentes, lavar o rosto ou fazer número 1.
Fujo para a sala, mas o olfato, a mais rápida das memórias me embriaga com tua barba dançando de novo na nuca. Olho para a tela nua da TV, como estou agora, em estupor.
Espero que a cozinha me acolha melhor, é o território das bruxas e suas alquimias, onde purgamos a raiva e exercitamos ouvir o sexto sentido.
Mas ali rastros de nós me levam inevitavelmente para ontem: o vinho derrubado, o avental que nos estimulou os abraços furtivos, algum aroma reincindindo após nossa orgia gastronômica da véspera, a toalhinha fora de lugar depois de ter me sentado no balcão, os ímas da geladeira meio caídos de tanto nos apertarmos entre ela e a pia.
Fujo para a janela e pela primeira vez em anos não me irrito com as brincadeiras infantis logo cedo. Os vizinhos das janelas próximas sorriem. Ouviram nossos risos e gritos? Não consigo retribuir, sua lacuna parece me envolver pelas costas e deixar sem reação.
Me refugio no computador, chamando urgente para parir tantas criações emergenciais. Mas clico errado e o programa abre uma foto que tirou numa madrugada idílica inspirado pelo néctar de Baco. Um curta metragem me faz reviver a vez em que posei para tuas lentes. O processador de texto se recusa a interagir com meu coração fora de órbita.
Me rendo ao chuveiro e espero que afinal, a água escorra rever suas mãos subindo nas minhas, me pegar viajando na imagem da cor do seu peito à meia luz e de termos inaugurado um novo costume - não o de perder brincos classicamente em reencontros raros como este, mas de quebrá-los.

Batida da amizade multicor

Olhar a cidade historicamente
lembrou do começo deste vai e vem
E tua transferência de dívida
teve gosto de comida colombiana
Minha saudade de samba
estourou rapidamente os tímpanos
A chuva quase nos esperou
mas os grafites não
Talvez nossas conversas sem fim
desviaram a atenção da mostra
E rever amigos da sua área
fervilhou minha usina de ideias
A música escocesa (ou irlandesa)
reacendeu a vontade de rodopiar
O cansaço nos brecou
e pipocou risadas à toa
Brincamos de fazer bolhas de sabão
e de perder o ar
Mas vinho demais
sempre destrava perigosamente a língua
Abrimos as comportas
da verdade e água salgada
Os cheiros e cores 
comprovaram que a arte da alquimia
carece de inspiração
A conexão de almas
das semelhanças e risadas
ainda reverbera
horas mais tarde
A mensagem truncada
me tira do eixo
E a presença de espírito
que habita em mim
quer relaxar nesse agora
e confiar que Deus 
não escreve certo por linhas tortas
é disléxico galopante


domingo, 20 de janeiro de 2013

A brother de profissão...

...é dessas poucas que alerta quando a barca está furada e estou prestes a embarcar nela desavisadamente. Já relevou quando a cegueira passional me fez furar por quem não merecia. Ajudou a encantar com o samba. Tem os olhos amorosos da minha avó: gostava de todos os ex, até os roubada escancarada em neon gritante. Me levou para espiritualidade xamânica. Vem da terra da minha mãe, daí ser tão descabidamente especial. Já me deu carona e tentou se encaixar na ex turma coxinha na qual estive forçosamente inserida tantos anos. Reveza comigo nos dramas do picadeiro da informação - pois lugar de palhaço é no jornalismo! Pegou carona na minha fase gandaia descontrol e à nossa maneira farreamos merecidamente. Nos reapaixonamos pela Vila Madalena entre sobes e desces pelas feirinhas, botecos e afins. Tem um jeito brejeiro na cozinha que é inspirador. Topou pagar mico cênico na minha matéria de direção só para segurar a onda da amiga metida à artista. Dá bronca quando digo que sou jornalouca e atristeza da família. Suaviza quando estou dando importância demais à comédia da vida privada familiar. Descola ingresso aos 45 do segundo tempo para bancarmos a tiete no show da Madonna. Me empresta livros como Viver para Contar do Gabriel Garcia Marquez, quase a fundo perdido. Suspira em dupla quando vemos Gael Garcia no cinema. Lembra quando estou dramatizando além da conta fora do palco que já passei por aquilo, vou passar de novo e logo tiro de letra. Sonha junto para virar realidade que estudaremos fora. Diz que minhas inspirações de madrugada que se perdem quando não escrevo são coisa de escritora, não de jornalista. Me defende para quem não me conhece, mas me rotula precipitadamente. Ri no meio da minha massagem, tornando até o mais terapêutico dos momentos cômico. Tem uma ânsia de se compreender, curar e encontrar que inspira a gente. É tia coruja. Me indica centro espírita quando estou vulnerável. Ajuda a desembaçar os óculos quando estou com as mãos engessadas para fazê-lo sozinha. Ri comigo das tragicomédias familiares, aliviando o que levaria sessões e mais sessões de terapia para relevar. É dessas irmãs que ao mesmo tempo que a vida não providencia oficiosamente, empresta extra oficialmente.

A japa da minha vida...

...me ensinou a fazer corte artístico de manga. Me fez apaixonar de vez pela arte gastronômica. E juntas nos deliciamos na meditação. Mimamos os gatos dela e até andar com meu cachorro ela quebrou esse galho. E me viu cair de madura na beira do lago da Aclimação e nem morreu de rir. E nos esparramamos na grama do Parque, rindo até quase molhar a roupa. Sempre que o atravessar da cidade é perigoso ou cansativo, ela me acolhe, não só com sofá cama, mas com comidinha natureba. Lemos tarô do Osho e ajudamos a outra a ver o que tem de especial e está o encoberto pela miopia emocional. Se diverte com o pé no peito do meu pai. Já segurou a bronca de quando deságuo por não dar conta quando tudo sai inacreditavelmente na contramão do sonhado. E dormiu em casa, se assustando com o toque do celular de madrugada. Nos encantamos com Fernanda Montenegro e outras tantas peças. Cantamos sem medo de parecer ridículas. Me emprestou livros terapêuticos como A Ciranda das Mulheres Sábias, de Clarice Pínkola Estes. Modelamos o barro que sobrou da aula de cerâmica que interrompeu. Puxa a orelha se a ansiedade estiver me virando muito de ponta cabeça. Me escancara que afinal, tantos retiros, meditações e vivências já tem algum saldo consideravelmente positivo. Me manda fechar os olhos quando os pombos batem as asas. E toma conta quando perigosamente não enxergo no meio da rua. Manda pular para subir quando a reincidência melancólica amorosa está muito extrapolada. Encena esquete teatral para aliviar minha barra na faculdade. Enfia o pé na jaca e chuta o pau no balde na mesma ânsia passional descabida que dividimos. Adverte se estiver distraidamente reinventando o BBB na janela da casa dela. Me ensina a reciclar. Dá vontade de aprender a lidar com planta. Diz que cozinho igual nordestino. É a que mais interage comigo no Fuçabook. Fotografa meus momentos mais mico do ano. Acredita que jornalistas tiram boas fotos. Me arranca da cama cedo demais e com uma delicadeza ariana. Atrasa peça com sua contemplativa forma de se arrumar. Compartilha roupa, apesar das diferenças de altura. Ensina receita natureba. Colabora para relativizar a tragicomédia da minha vida. Alerta que enquanto o jornalismo saboneta, o teatro me chama numa linguagem ainda ininteligível. Não me deixa dar trela para quem não merece. Vê um poesia meio Fernando Pessoa nos meus posts. Não por acaso, nos conhecemos num retiro chamado "O Caminho do Coração". Grazie hermana!

A vida é um segredo de Deus sussurado numa noite de chuva

Descubro que uma das paixões familiares da minha vida tem traços de depressiva crônica: acha a vida feia. Sei que melhorei não por querer fazer tudo ao mesmo tempo aqui e agora, mas por voltar a sentir uma empolgação infantil pela vida. Pelo que não tem preço. A amiga que quer te dar um presentão que ainda não pode pagar. Dormir com a filha do primo. Cantar e recomendarem que invista nisso. Fazer yoga sozinha e virem perguntar se dá aula. Dançar de olhos fechados e ouvir que é bailarina profissional. Fazer rir em cena. Lembrarem de "contação" de história sua no metrô. Não te reconhecerem no palco. Rir com amigos até a barriga doer. Ganhar abraço de criança depois de encenar uma lenda budista. Ouvir que teus textos tem um quê de Woody Allen, Fernando Pessoa e Clarice Linspector. Brincar com o afilhado. Se embriagar com a filha da amiga no colo e não querer por no berço nunca mais. Encontrar o espaço de paz entre um pensamento e outro meditando. Ouvir de aluna "aborrescente" para continuar dando aula, mesmo cismada que não acerta tanto a mão quanto gostaria. Autografar as páginas publicadas para os amigos e parentes. Aprender e ouvir apaixonados por diferentes assuntos em matérias das mais variadas. Massagear e ouvir que fez acreditar que a felicidade existe, fazer dormir melhor por dias, escutar que tem mão boa para aquilo, por para roncar com as pontas dos dedos. Cozinhar para quem se gosta e ver repetirem. Gargalhar com livro em condução pública. Andar na beira da praia. Subir montanha e encher os olhos com a vista de cima. Sentar na beira do rio e ficar com os pés n´água. Andar a cavalo. Reler livros criados e desenhados na infância. Ouvir que pelo que conhecem de você, não consegue fazer trabalho meia boca. Vento no calor. Escutar que tem estilo. Sol no frio. Criar. Se esquecer na rede. Fazer banho de creme. Hidromassagem. Pintar o cabelo e acharem que é natural. Aprender a se maquiar. Querer chorar com grafite. Se besuntar de hidratante. Sentir a presença do Dalai Lama. Reencontrar amigo sem planejar. A afilhada te considerar tanto, mesmo sendo uma madrinha de quinta categoria. Beber água de coco. Ouvir o Lama Padma Santem. Incenso. Estudar literatura com aspirantes a escritores. Ensinar Frida e Gabriel Garcia Marquez para quem não parecia curtir artes plásticas ou ler uma "bíblia". Dar presente. Ganhar livro. Depois de um filme dividir com um companheiro de sala escura: "não é lindo"? Explorar a luz e acertar na fotografia. Gilberto Gil. Generosidade familiar. Bolinho de chuva. Borboletas dando rasantes na boca do estômago. Comida indiana. Se esquecer no mar. Tomar chuva. Deitar na grama. Receber amigo. Bancar a tiete em show internacional. Conhecer todas as músicas em apresentação musical. Tchai. Apagar na aula de yoga. U2. Se equilibrar na bola no pilates. Cachorro vir consolar quando você "abre a boca". Meditar nadando. MPB. Céu estrelado. Cheiro de terra vermelha, café e chuva. Comida orgasmática. Reggae. Dançar forró. Comida mexicana. Ligação de amigo. História em quadrinhos. Ouvir que está cheirosa quando parece que o banho de creme, perfume, desodorante e leave in venceu. Fazer retiro. Reencontro. Criança arisca te dar beijo. Lerem nas entrelinhas do que você escreveu. Música indiana. Mergulhar. Tocarem para você. Se divertir com a companhia, independente do programa virar um mico. Fazer tirolesa. A gatinha da amiga querer dormir com você e te lamber. Beijo sincronizado. Pintar cerâmica. Ser carregada no colo quando fragilizou. Ficar descalça. A filha da sua amiga pedir sua presença na festa em que só mães seriam convidadas. Foto de infância. Colegas de trabalho lembrarem de você. Dançar música africana. Dar banho. Sono em que se lembra dos sonhos. Comer gemendo. Festa à fantasia. Descobrir música. Modelar. Redescobrir uma cantora. Ler Veríssimo e Mário Prata. Rir online com colega sarrista. Elogiarem seu sorriso depois de ser o maior lucro da indústria ortodôntica. Prosa com cabeleireiro antigo. Lembrarem da sua voz ou nome mesmo quando tua memória não ajuda. Conhecer lugar novo. Moda de viola sem letra. Aprender o que parecia ininteligível. Fazer circo. A terapêutica do trabalhar ensandecidamente. Rir da sua desgraça. Sambar mesmo sem saber. Fazer trilha com tempo nublado. Esperança pós deprê. Ganhar flor. Abraço. Banho gelado no calor. Cheiro de comida ficando pronta. Personalizar sua casa. Sonhar acordada. Fazer criança rir. Dormir com barulho de chuva. A libertação pelo riso. Fazer trabalho voluntário. Retorno positivo inesperado. Experiência mística. Dança cigana. Fogos de artifício sem barulho. Chorar de alegria. Ser surpreendida. Serem generosos com a gente. Livro infantil. Perfume amadeirado. Cafuné. Sonhar acordada. Comida natureba. Lavar o quintal. Tomar banho de mangueira. Te reconhecerem depois de suar a camisa. Insônia criativa.