Minha mente é um 220 voltz intermitente. Para mim costuma ser mais difícil desligar para sonhar do que pular da cama. E o parceiro de dança recém conhecido no Sesc Vila Mariana acertou na mosca: preciso por o corpo para movimentar para desligar e ressonar. E há três semanas tenho feito isso, mas estou num reacender do meu caso de amor com a dança. Qual? Todas que puder experimentar. "Peguei o bonde andando para sentar na janelinha e dar tchauzinho" na aula aberta, mas como o ponta pé inicial foi forró, o corpo comprovou que realmente tem memória e rapidamente retornou às noites de Canto da Ema com a hermana de teatro "rastapé". Melhor antídoto contra a ansiedade. Se tiver dor pulsando, elas vão embora para cima da árvore mesmo, sem muito esforço. O colega de dois para lá e dois para cá percebeu que sou exageradamente elétrica e foi corporalmente retomando a condução: se deixar danço por minha conta e risco, pois como diria aquela comunidade antiga do Orkut, sou "autodivertida".
A didática não podia ser mais acertada: um professor ia explicando e pondo os homens para soltar o esqueleto e uma mulher fazia o mesmo conosco, para depois unirem os casais - a mestra generosamente também fazia as vezes de condutora. Sempre enfrentamos um déficit de parceiros nestas aulas, mas me jogo no ritmo mesmo sozinha ou com aspirantes a dançarinas
Depois veio explicação para o samba de gafieira! Quando a música nos estimulou, a mente veio palpitar, tentando descer da árvore:
- Não sabia que o Ney Matogrosso cantava este ritmo.
Mas devo ter aplicado a técnica do deixar o pensamento ir embora como nuvem, relembrada no começo da semana pelo Lama Padma Samtem. Reconheci a Elza Soares em dueto com ele, lembrei das noitadas no Teatro Mars na Bela Vista e foquei no corpo, nas dicas recebidas... Até que... Num segundo mágico senti o que os meditadores do Osho estimulavam: virei a dança. A mente pausou e eu sambei gafieira! Claro, por ser mágico dura uma fração de segundo. Mas já vale pela semana inteira.
Rodopio é lúdico, mas alongar e equilibrar o corpo já lapida a mente para sonos mais reconfortantes e trabalhos ligeiramente mais dificultosos. Como a facilitadora que me chamava para suas aulas é elétrica como eu, esperava suar tudo que está sobrando entre os pensamentos. Mas sua irmã que presenteou com uma prazerosa surpresa: yoga aérea.
Para quem tem saudade inconfessa do tecido do circo, parcamente experimentado e precocemente desistido, foi um mágico mergulho no abismo. Tinha pavor de qualquer ensaio de aula de ginástica olímpica na infância, com a mais modesta das alturas e venho desconsiderando este cagaço vida afora. Às vezes minha mente na árvore fez falta para captar as orientações da professora. Mas compensava do outro lado. Me senti aqueles bebês fotografados pela Anne Geddes. É quase um voltar ao útero. As costas se ressentiram na invertida e talvez por isso a foto saiu meio treme treme igual as histórica favela vertical do centro antigo.
Mas no relaxamento. Foi quase um renascimento. Compreendi vagamente o distanciamento daquele espaço tão terapêutico para mim. Foi um entendimento dum mal estar tão antigo e súbito que as previsíveis lágrimas "voltaram para o mar interno". Fiquei em dúvida de onde encaixar os braços, mas a liberação para liberá-los como achasse melhor me levou quase para as redes das chácaras de amigos, da família, do interior...
Embarquei na música. Mais tarde venci minha hiperatividade de querer criar noite adentro conectada. E para meus padrões hiperativos dormi cedo. Consegui começar o expediente antes do previsto e sem me irritar com o cortador de grama uivando na beira da janela. Venci o pavor de enfrentar o "tecniquês" adiado e não doeu tanto quanto imaginado. Ao contrário do que diz o Osho, o que imaginamos também pode ser pior do que quando acontece. Namastê para você também nesta manhã fresquinha como minha natureza calorenta agradece.
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013
50 esticadas amarradas no RPG
Ele me amarra e eu quero rir: lembro do sucesso do campeão de vendas nas livrarias e me divirto, pois à primeira vista é uma tortura chinesa contrair abdômen, manter a perna a 90 graus, ficar com os braços imobilizados e respirando... Só que o respirando faz toda a diferença. Capotei tão caprichadamente em algumas sessões que desconfio que o melhor sono não é o pós sexo, é o da sequência da reeducação postural global. Num dos atendimentos, até sonhei e queria discutir o enredo idílico com o terapeuta. Só não foi vexatório pois como diz minha mãe, não sei como não nasce cupim na minha cara.
Mas as tiras nos amarrando, a barriga firme, as pernas para cima e o ar indo e vindo nos surpreendem. Numa tarde derrubei umas lágrimas, sem fazer muita ideia qual a razão. Ele queria saber se estava tudo bem e eu "sabonetei":
- Não faz pergunta difícil. Sei lá o que essa água salgada está fazendo escorrendo na minha cara.
Sessões mais tarde eu desabei mesmo, a ponto dele buscar papel no banheiro do lado. Desconfio que não fazia ideia do quanto segurei de carcaça emocional embutida inconscientemente no corpo. Mas lá alinhada, amarrada... Aliviei. Até desabafei o que desconfiava ser a causa do chororô e embora a mulher dele é que seja psicóloga, ele também bancou o analista na beira do divã, quer dizer, à cabeceira da maca.
Nesta manhã eu ri de tudo, mesmo dormindo uma merreca. Desembestei a falar, para evitar dormir. Quero entrevistar o terapeuta, mas ele está é concentrado em tracionar meu pescoço, tirar a tensão dos ombros, realinhar costas, pernas, pés... Já fiz fisio de pilates, aquela "engana trouxa" de convênio cheia de choquinhos, com trocentos pacientes divididos em "zilhares" de biombos e o RPG. Em 2/3 delas sempre tenho medo de soltar gases quando eles começam nos virar para lá e para cá nos exercícios. "Grazie a Dio" ainda não paguei este mico. Mas ria de imaginar! Ria com as tiras me amarrando sem segundas intenções. Ria sei lá do que. De sono. Pra despistar o quanto meu sacro dói. Falo para ele escrever que deve ter tanta história de paciente "louca mansa" igual. Mas a menina das letras sou eu, não ele. Quem quer escrever ou encenar tudo que vê pelo caminho sou eu. Ele deve querer desentortar todo mundo, como um amigo que atua na mesma área.
E eu que tinha ouvido que o RPG para quem já estudou yoga não ia dar muita diferença. Que petulância de quem falou! Mesmo com curso de massagem, alongamentos que fazíamos nas aulas de teatro... As milhares de horas no "com...puta...dor" só podem desandar com tudo.
- Respira!
Voltando ao eixo. Ele é firme, que se der corda embalo nas brincadeiras, desalinho, rolo de rir ou choro "a cântaros" sem entender nada. Depois de formigar os pés de tanto alongar, do sacro me doer, de relaxar para ele encaixar a coluna e tirar a calça do lugar sem querer - pois todo o guarda roupa está sambando em mim, de sentir as mãos dele dando um trato nos ombros, olho para a bola de pilates e não resisto:
- Deixa eu alongar nela?
Me sinto tão criança feliz esticada e respirando assim. Fiz lá "fotozinhas" para registrar como saio do RPG. Mas saíram "daquele jeito", afinal estava de ponta cabeças. Sempre saio da maca leve como quem tomou um banho de sal grosso. E defendendo que devia fazer parte da declaração universal dos direitos humanos: a reeducação postural global. Para eu e minha amiga já é tanto direito adquirido que fazemos no metrô cheio, encostadas à parede, respirando fundo e soltando o ar sem pressa nem medo de ser feliz. Reposicionando a rainha, como a atriz Georgette Fadel considera a coluna. O eixo de tudo. Bendita seja a lombar que não deu mais sinal de vida...
Mas as tiras nos amarrando, a barriga firme, as pernas para cima e o ar indo e vindo nos surpreendem. Numa tarde derrubei umas lágrimas, sem fazer muita ideia qual a razão. Ele queria saber se estava tudo bem e eu "sabonetei":
- Não faz pergunta difícil. Sei lá o que essa água salgada está fazendo escorrendo na minha cara.
Sessões mais tarde eu desabei mesmo, a ponto dele buscar papel no banheiro do lado. Desconfio que não fazia ideia do quanto segurei de carcaça emocional embutida inconscientemente no corpo. Mas lá alinhada, amarrada... Aliviei. Até desabafei o que desconfiava ser a causa do chororô e embora a mulher dele é que seja psicóloga, ele também bancou o analista na beira do divã, quer dizer, à cabeceira da maca.
Nesta manhã eu ri de tudo, mesmo dormindo uma merreca. Desembestei a falar, para evitar dormir. Quero entrevistar o terapeuta, mas ele está é concentrado em tracionar meu pescoço, tirar a tensão dos ombros, realinhar costas, pernas, pés... Já fiz fisio de pilates, aquela "engana trouxa" de convênio cheia de choquinhos, com trocentos pacientes divididos em "zilhares" de biombos e o RPG. Em 2/3 delas sempre tenho medo de soltar gases quando eles começam nos virar para lá e para cá nos exercícios. "Grazie a Dio" ainda não paguei este mico. Mas ria de imaginar! Ria com as tiras me amarrando sem segundas intenções. Ria sei lá do que. De sono. Pra despistar o quanto meu sacro dói. Falo para ele escrever que deve ter tanta história de paciente "louca mansa" igual. Mas a menina das letras sou eu, não ele. Quem quer escrever ou encenar tudo que vê pelo caminho sou eu. Ele deve querer desentortar todo mundo, como um amigo que atua na mesma área.
E eu que tinha ouvido que o RPG para quem já estudou yoga não ia dar muita diferença. Que petulância de quem falou! Mesmo com curso de massagem, alongamentos que fazíamos nas aulas de teatro... As milhares de horas no "com...puta...dor" só podem desandar com tudo.
- Respira!
Voltando ao eixo. Ele é firme, que se der corda embalo nas brincadeiras, desalinho, rolo de rir ou choro "a cântaros" sem entender nada. Depois de formigar os pés de tanto alongar, do sacro me doer, de relaxar para ele encaixar a coluna e tirar a calça do lugar sem querer - pois todo o guarda roupa está sambando em mim, de sentir as mãos dele dando um trato nos ombros, olho para a bola de pilates e não resisto:
- Deixa eu alongar nela?
Me sinto tão criança feliz esticada e respirando assim. Fiz lá "fotozinhas" para registrar como saio do RPG. Mas saíram "daquele jeito", afinal estava de ponta cabeças. Sempre saio da maca leve como quem tomou um banho de sal grosso. E defendendo que devia fazer parte da declaração universal dos direitos humanos: a reeducação postural global. Para eu e minha amiga já é tanto direito adquirido que fazemos no metrô cheio, encostadas à parede, respirando fundo e soltando o ar sem pressa nem medo de ser feliz. Reposicionando a rainha, como a atriz Georgette Fadel considera a coluna. O eixo de tudo. Bendita seja a lombar que não deu mais sinal de vida...
Dança indiana amplia repertório de contadores de histórias
Experimentei a Odissi, dança indiana indicada para contadores de história aprimorarem sua expressão corporal. Como é ritualística, lembrei de um ensinamento que no Japão a dança e o teatro não são separados e acredito que na Índia também não sejam, pois o corpo vai mesmo desenhando um roteiro, tamanha a precisão dos movimentos. É de uma gratidão extrema começar a prática pedindo corporalmente para que a terra nos permita bater os pés nela. No início é difícil coordenar cada detalhe das mãos, pés, joelhos e peito - mas acredito que todas as primeiras vezes são meio às cegas e depois tudo precisa aprimorar com a prática. Ouvindo a professora fui incapaz de entender vários termos, mas reconheci que eram do balé. O corpo agradeceu o alongamento pré e pós coreografias - raramente praticados na maioria das aulas que conheço por aí. Pela primeira vez interagi com a barra das bailarinas e agradeci pelo meu corpo não ter perdido a flexibilidade. Os movimentos são tão detalhados que deve levar um tempo significativo de estrada para conquistarmos, mas valeu a tentativa, pois os músculos e a mente agradecem por ficarem tão entregues e presentes naquele empenho de dar o máximo possível dentro da coordenação que me falta. Absolutamente tudo que é leve e devagar se transforma num desafio sobre humano para mim, mas já não sofro com isso, pois sou assumidamente estabanada. As música indianas reverberam em algum lugar dentro de mim que não sei definir ao exato onde. E é sutil, mas quando a cabeça indica ao expectador os movimentos da mão, como não se deixar encantar? Ainda matei as saudades da yoga, pois fizemos saudação ao sol - o difícil era só acertar de que lado ele nascia em meio a tantos prédios. Pela primeira vez em décadas achei uma pena não ter pedido para fazer balé na infância, pois ouvi uma outra professora numa aula deste tipo e percebi o quanto elas têm consciência corporal e mais que isso, tratam a coluna como rainha, que é como a atriz Georgette Fadel a chama - o que beneficia a vida da gente, não serve só à dança. Certamente minha lombar agradeceria. Antigamente me frustraria de perder entre tantas orientações de postura, deslocamento, equilíbrio... Hoje em dia quero fazer cada vez mais e me livrar a toque de caixa da máscara de desastrada que assumi e não me serve mais. Que o tempo e a verba colaborarem. Evoé!
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
O que tem no seu baú de vime?
Cacei em meu baú de recordações o cartãozinho de uma professora primária, que me inspira a personalizar meu exame de retina, enquadrar e pendurar um controle que faço sempre, mas que agora me despertou um olhar de artista plástica. Aquela paisagem avermelhada estilizada morreu na minha infância e desapareceu dos meus tesouros guardados, mas sem querer me fez bem visitar a adolescente e menina que fui.
Matei saudades de primas que ainda são próximas de coração, mesmo com a distância não colaborando. "Desentendi" como tem quem passou a infância tão próxima se distanciou quilômetros adulta. Puxei pela memória, mas não faço ideia de quem era "meu amor" a que uma colega fazia referência numa correspondência.
Vi fotos centenárias, de quando ainda tinha o ar de quem está quase com medo da câmera. Reencontrei pelas linhas inspiradas uma amigona de adolescência (que como diz o Rubem Alves, é um prolongamento da infância), diziam que éramos parecidas e ela recomendava enfática para sermos nós mesmas, doesse a quem doesse. Até hoje são conselho e batalha atuais!
Cartões de comadre que perdemos o contato periodicamente e retomamos "antes tarde do que mais tarde". Como sempre, ela se deprecia e desenha ela mesma gorda: continua fazendo o mesmo no Fuçabook. Mais cartões do antigo cunhado que do irmão dele. Faz sentido, devo ter dado cabo e já nem lembro mais. Um cartaz que fiz com o verso da música do tio com quem me dou melhor "vamos amar por igualdade, se Deus for negro você não sabe". Que "judiaria": ele perdeu a maior parte das músicas que fez, esqueceu, gravou, deu para amigos e escafedeu-se. Todo artista é relapso assim com sua obra? Se não tiver família ou amigos cuidadosos querendo preservar ou levantar tudo depois, era uma vez...
Entradas, releases, máscara de mergulho, cardápio das viagens à Disney: já não distingo o que foi a trabalho e o que foi diversão com minha tia, pois foram duas idas e vindas, ambas ganhas. Guardava tudo que pudesse reter na memória as comidas, as paisagens, os frios na barriga, os mergulhos, as risadas, o sol, aqueles flamengos no "lagozinho" artificial, a montanha russa em que fizemos um escândalo e não nos conformamos com os gringos impassíveis atrás de nós...
A coleção de cartões postais! Deus e o mundo me trazia mais um para aumentar a quantidade dos que guardava, lugares que queria conhecer, outros que tinha visitado, agrados de amigos e parentes que talvez gostariam de ter me levado na bagagem, mas traziam uma partezinha do lugar visitado, só para manter em banho maria minha ânsia mochileira represada.
Os telegramas e cartãozinho das tias, inspirados. Os que ganhei quando menstruei a primeira vez fazem rir, são espontâneos, comemoraram comigo uma visita aguardada e nem parece que já se passaram tantos anos. A vizinha desenhou um rio vermelho no que me deu. A das tias já era cor de paixão e era um prenúncio da profissão futura: dizia que anunciaria aquela data tão histórica nos jornais, na TV...
Misterioso reler desejos de quem não lembro mais o rosto. Cartinha de uma das primeiras paixões: também não lembro mais a cara dele! Segredos escondidos de quem hoje não se abre nem por decreto. Cartinhas do tio, primo e tia paranaenses: só lembrava do avô fazer estes registros periódicos de nossa saudade em papéis da máquina de café em que trabalhou, do resto da família não tinha lembrança de receber cartas...
Fotos que jurava perdidas. Cartões de outras professoras, com paisagens diferentes da que procurava naquela noite. Pedido de gravações de músicas da prima: sons que não ouvimos há uma geração. Fita com minhas locuções na rádio: onde ouvir isso hoje em dia? Saudade da banda que o cunhado tocava, sem querer a música já dava indícios de que eu e o irmão dele acabaríamos no barranco amoroso.
Recursos de quando fazíamos matérias antes do Google: catálogos, propagandas, releases impressos, fotos impressas. Carteirinhas de estudante do período paleozoico. Uma fotozinha da segunda paixão da vida: se não fosse pelo baú, esqueceria completamente como ele se parecia.
Dias depois, estas memórias me saltam com maior importância: provavelmente por uma colega estar tratando câncer e ter dito que depois de uma convulsão perdeu ou ainda vai recuperar parte do seu passado. Fico me achando nada sem os amigos, primos, viagens, amores, vizinhas, sonhos antigos que me estofaram até aqui. E se apagasse como a amiga de profissão? O que ficaria? Faria falta o que não se lembra, como em noite de bebedeira? Sonharia com o que tento recuperar? Como saberia o que é vigília e o que é sonho? De que são costuradas estas lembranças mágicas?
Tenho medo até de tirar pó do baú e um fiapo do que vivi se perder. Um mundo significativo meu está lá. Se minha colega rever o que guardou, recupera o que se foi? Quem deu licença da memória pregar peças assim em nós? Dizem que uma parte é memória e a outra, invenção. Seria mais criativa se me dessem brancos definitivos? Acho que escrevo tanto para o que passou não escapar de mim. O que fazemos por quem a memória escapuliu por entre os dedos? Eu recomendei a ela que escrevesse... É sempre catártico.
Matei saudades de primas que ainda são próximas de coração, mesmo com a distância não colaborando. "Desentendi" como tem quem passou a infância tão próxima se distanciou quilômetros adulta. Puxei pela memória, mas não faço ideia de quem era "meu amor" a que uma colega fazia referência numa correspondência.
Vi fotos centenárias, de quando ainda tinha o ar de quem está quase com medo da câmera. Reencontrei pelas linhas inspiradas uma amigona de adolescência (que como diz o Rubem Alves, é um prolongamento da infância), diziam que éramos parecidas e ela recomendava enfática para sermos nós mesmas, doesse a quem doesse. Até hoje são conselho e batalha atuais!
Cartões de comadre que perdemos o contato periodicamente e retomamos "antes tarde do que mais tarde". Como sempre, ela se deprecia e desenha ela mesma gorda: continua fazendo o mesmo no Fuçabook. Mais cartões do antigo cunhado que do irmão dele. Faz sentido, devo ter dado cabo e já nem lembro mais. Um cartaz que fiz com o verso da música do tio com quem me dou melhor "vamos amar por igualdade, se Deus for negro você não sabe". Que "judiaria": ele perdeu a maior parte das músicas que fez, esqueceu, gravou, deu para amigos e escafedeu-se. Todo artista é relapso assim com sua obra? Se não tiver família ou amigos cuidadosos querendo preservar ou levantar tudo depois, era uma vez...
Entradas, releases, máscara de mergulho, cardápio das viagens à Disney: já não distingo o que foi a trabalho e o que foi diversão com minha tia, pois foram duas idas e vindas, ambas ganhas. Guardava tudo que pudesse reter na memória as comidas, as paisagens, os frios na barriga, os mergulhos, as risadas, o sol, aqueles flamengos no "lagozinho" artificial, a montanha russa em que fizemos um escândalo e não nos conformamos com os gringos impassíveis atrás de nós...
A coleção de cartões postais! Deus e o mundo me trazia mais um para aumentar a quantidade dos que guardava, lugares que queria conhecer, outros que tinha visitado, agrados de amigos e parentes que talvez gostariam de ter me levado na bagagem, mas traziam uma partezinha do lugar visitado, só para manter em banho maria minha ânsia mochileira represada.
Os telegramas e cartãozinho das tias, inspirados. Os que ganhei quando menstruei a primeira vez fazem rir, são espontâneos, comemoraram comigo uma visita aguardada e nem parece que já se passaram tantos anos. A vizinha desenhou um rio vermelho no que me deu. A das tias já era cor de paixão e era um prenúncio da profissão futura: dizia que anunciaria aquela data tão histórica nos jornais, na TV...
Misterioso reler desejos de quem não lembro mais o rosto. Cartinha de uma das primeiras paixões: também não lembro mais a cara dele! Segredos escondidos de quem hoje não se abre nem por decreto. Cartinhas do tio, primo e tia paranaenses: só lembrava do avô fazer estes registros periódicos de nossa saudade em papéis da máquina de café em que trabalhou, do resto da família não tinha lembrança de receber cartas...
Fotos que jurava perdidas. Cartões de outras professoras, com paisagens diferentes da que procurava naquela noite. Pedido de gravações de músicas da prima: sons que não ouvimos há uma geração. Fita com minhas locuções na rádio: onde ouvir isso hoje em dia? Saudade da banda que o cunhado tocava, sem querer a música já dava indícios de que eu e o irmão dele acabaríamos no barranco amoroso.
Recursos de quando fazíamos matérias antes do Google: catálogos, propagandas, releases impressos, fotos impressas. Carteirinhas de estudante do período paleozoico. Uma fotozinha da segunda paixão da vida: se não fosse pelo baú, esqueceria completamente como ele se parecia.
Dias depois, estas memórias me saltam com maior importância: provavelmente por uma colega estar tratando câncer e ter dito que depois de uma convulsão perdeu ou ainda vai recuperar parte do seu passado. Fico me achando nada sem os amigos, primos, viagens, amores, vizinhas, sonhos antigos que me estofaram até aqui. E se apagasse como a amiga de profissão? O que ficaria? Faria falta o que não se lembra, como em noite de bebedeira? Sonharia com o que tento recuperar? Como saberia o que é vigília e o que é sonho? De que são costuradas estas lembranças mágicas?
Tenho medo até de tirar pó do baú e um fiapo do que vivi se perder. Um mundo significativo meu está lá. Se minha colega rever o que guardou, recupera o que se foi? Quem deu licença da memória pregar peças assim em nós? Dizem que uma parte é memória e a outra, invenção. Seria mais criativa se me dessem brancos definitivos? Acho que escrevo tanto para o que passou não escapar de mim. O que fazemos por quem a memória escapuliu por entre os dedos? Eu recomendei a ela que escrevesse... É sempre catártico.
sábado, 2 de fevereiro de 2013
Embriagar dos seis sentidos
Sente: o acaso reavivou essa amizade multicor
Põe o ouvido: de um lado ela soluça
e embarcar na outra ponta, que perde o fôlego de rir
Olha: sem as máscaras cotidianas
o outro vira um menino bonito como a infância
e de cá o reacender do ímã cria doces e salgados
se lambuza de tempero e compartilha
a efervescência gastro-natureba-gourmet
Cheira: o perfume amadeirado batizou
a bancada de trabalho
criando uma âncora emocional
e disparando flashs de curta metragem
que o olfato é a mais rápida das memórias
Escuta: esse som tem um novo lastro
se impregnou de mais um ciclo
já não pode ser ouvido da mesma maneira
Morde: o que sai do forno
é salpicado desta gana
de inventar outros pratos
de besuntar panelas
e se embebedar com a alquimia wicca
Tateia: esses cremes já voltam
testados e aprovados
o perfume, trilha do dançar dos dedos
e o Ph um desconcertante embaralhar dos pelos da pele
Aguça o sexto sentido:
o que prevê a irriquieta palavra
de onde vem a cena que o sonho ensaia
para onde vai essa mancha do reencontro
de onde surge esse abraço que levanta
como brota esse toque que apazigua
Toma essa chuva comigo?
Nesse abraço é que mora o perigo
Põe o ouvido: de um lado ela soluça
e embarcar na outra ponta, que perde o fôlego de rir
Olha: sem as máscaras cotidianas
o outro vira um menino bonito como a infância
e de cá o reacender do ímã cria doces e salgados
se lambuza de tempero e compartilha
a efervescência gastro-natureba-gourmet
Cheira: o perfume amadeirado batizou
a bancada de trabalho
criando uma âncora emocional
e disparando flashs de curta metragem
que o olfato é a mais rápida das memórias
Escuta: esse som tem um novo lastro
se impregnou de mais um ciclo
já não pode ser ouvido da mesma maneira
Morde: o que sai do forno
é salpicado desta gana
de inventar outros pratos
de besuntar panelas
e se embebedar com a alquimia wicca
Tateia: esses cremes já voltam
testados e aprovados
o perfume, trilha do dançar dos dedos
e o Ph um desconcertante embaralhar dos pelos da pele
Aguça o sexto sentido:
o que prevê a irriquieta palavra
de onde vem a cena que o sonho ensaia
para onde vai essa mancha do reencontro
de onde surge esse abraço que levanta
como brota esse toque que apazigua
Toma essa chuva comigo?
Nesse abraço é que mora o perigo
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013
A Molequice ensaia a cura
Quando doeu o perdão não digerido
o superfaturamento das relações arrefeceu
E reencontrei um menino
que me toca e suaviza
Mas é uma criança crescida
e não tem como apaziguar
essa dor de infância
Quando me vi manipuladora
aliviei a mão na ansiedade
E meu sorriso se escondeu
mas soltar as carcaças
da emotividade contida
No menino que sente falta da minha risada
suou o que não pode ser restaurado
E a mão do menino
passeou entre meus cortes mal cicatrizados
Ele ri comigo
e a madrugada perde a densidade
Numa gangorra recém descoberta
estas crianças se aninharam
Minha barriga acolheu e se arrepiou
com teu sopro
A parte rasgada de mim
se esqueceu na leveza deste pique e pega
Este menino deve se embaralhar
quando a sem gracice enfrenta minha malícia
A mágoa encroada me tira da cama aos soluços
E esta criança com band aid emocional
estranha o colar com perfume adulto
perdido no playground
o superfaturamento das relações arrefeceu
E reencontrei um menino
que me toca e suaviza
Mas é uma criança crescida
e não tem como apaziguar
essa dor de infância
Quando me vi manipuladora
aliviei a mão na ansiedade
E meu sorriso se escondeu
mas soltar as carcaças
da emotividade contida
No menino que sente falta da minha risada
suou o que não pode ser restaurado
E a mão do menino
passeou entre meus cortes mal cicatrizados
Ele ri comigo
e a madrugada perde a densidade
Numa gangorra recém descoberta
estas crianças se aninharam
Minha barriga acolheu e se arrepiou
com teu sopro
A parte rasgada de mim
se esqueceu na leveza deste pique e pega
Este menino deve se embaralhar
quando a sem gracice enfrenta minha malícia
A mágoa encroada me tira da cama aos soluços
E esta criança com band aid emocional
estranha o colar com perfume adulto
perdido no playground
O sertão emocional onde acendo uma vela
O cheiro desconcertou
e agora é sertão
Os textos fisgaram
já não se enxerga um palmo no sertão
O sorriso capturou
e a textura é nova nesse sertão
A paisagem urbana relembrou
onde está o guia deste sertão?
As contas budistas rememoraram
para onde este sertão está levando?
A roupa se destacou
como lidar com o calor do sertão?
Os brincos se partiram
para onde foram os rastros neste sertão?
O paladar ensaiou uma captura
qual é o gosto deste sertão?
A paixão pelo canto foi incendiada
que som tem esse sertão?
O ímã reconectou
quais são as conexões neste sertão?
As memórias se realinharam
qual é a história deste sertão?
Este tatear no escuro virou literatura
de onde vem a inspiração no sertão?
Esse dançar sem música
qual é o som no sertão?
As mãos viram o que escapou ao olho
como é mesmo a paisagem no sertão?
As risadas evaporaram o cansaço
onde está a rede deste sertão?
e as almas se perderam na conversa
qual é a palavra pra este sertão?
e agora é sertão
Os textos fisgaram
já não se enxerga um palmo no sertão
O sorriso capturou
e a textura é nova nesse sertão
A paisagem urbana relembrou
onde está o guia deste sertão?
As contas budistas rememoraram
para onde este sertão está levando?
A roupa se destacou
como lidar com o calor do sertão?
Os brincos se partiram
para onde foram os rastros neste sertão?
O paladar ensaiou uma captura
qual é o gosto deste sertão?
A paixão pelo canto foi incendiada
que som tem esse sertão?
O ímã reconectou
quais são as conexões neste sertão?
As memórias se realinharam
qual é a história deste sertão?
Este tatear no escuro virou literatura
de onde vem a inspiração no sertão?
Esse dançar sem música
qual é o som no sertão?
As mãos viram o que escapou ao olho
como é mesmo a paisagem no sertão?
As risadas evaporaram o cansaço
onde está a rede deste sertão?
e as almas se perderam na conversa
qual é a palavra pra este sertão?
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