Colegas de uma profissão ligeiramente ingrata passam na roleta de um microônibus na grande São Paulo e... Quero dizer, um deles passa. A outra conta moeda, caça trocado na bolsa, cansa a fila atrás dela, preocupa o amigo que já arrumou lugar do lado de lá, até que encontra uma solução no mínimo esdrúxula para o impasse do dinheiro perdido entre bolsa e carteira:
- O senhor podia aceitar estes vinte centavos de euro?
- De que?
- Euro!
- Que diabo é isso?
- Moeda europeia.
- Minha senhora, essa moeda só vem, não volta, aqui não é casa de câmbio!
- Vale três vezes a nossa, da última vez em que cotei. Era uma recordação de viagem, mas...
- Mas o que?
- O senhor leva um amuleto de viajão esperado inesquecível que trará imensa sorte em sua vida!
- E eu lá sou místico?
- Pode começar uma poupança para rodar o mundo...
- Sendo cobrador na periferia? Sei...
- Na Argentina aceitam real, peso e dólar.
- Deve ser por isso que não saem da crise. E isso lá pode?
- Ah, dizem que é ilegal, mas parece que esta norma, lei, sei lá... Também não pegou.
- Ah, as leis também não pegam com os hermanos? Sei...
- Esta moeda traz o frio de Paris.
- E o que mais passageira imaginativa?
- O metrô de sonhos de Londres.
- Conte-me sobre seus devaneios turísticos.
- Os chafariz de Madri.
- Está começando a melhorar a paisagem.
- Os museus de Barcelona.
- Devem ser caros.
- As construções históricas de Roma.
- Preferia que você me desse moeda brasileira mesmo e mostrasse as fotos, que já está de bom tom.
- Tenha um pouco mais de olhar empreendedor! Poderão atender passageiros de todo mundo ampliando aceitação monetária na catraca!
- Gringos quase não visitam o ABC e se visitam, os amigos e parentes andam de carro ou táxi. Nunca vi falarem outra língua nesses corredores.
- Talvez só esteja faltando esse passo de começar aceitar moeda de fora.
- Deus me livre, começarão a perguntar em inglês, espanhol e aí sim que terei que me fingir de dorminhoco, pois não saberei responder!
- Moça, a gente precisa passar - pedem passageiros acumulando atrás da negociante persistente.
O colega de trabalho cansa e volta à catraca:
- É isso que falta cobrador?
- Obrigado!
A catraca destrava e ela quer saber:
- Ué, como sabia que só faltava...
- É sua especialidade empacar nesses centavozinhos finais de passagem. Vem, vamos perder o ponto.
E assim se vai uma tentativa de por em circulação o amuleto de 20 cents de euro, "carreador" de tantas lembranças de mochilão... Quer dizer, de pochete, pois professor é mais modesto na saída ao exterior.
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