domingo, 27 de julho de 2014

Insone

Noite dilatada
barulhos amplificados
cansaço fanfarrão
me deixa afundar
em delírio onírico
uns instantes de morte voluntária
mas o respirar intermitente
me frita nos lençóis
dá a fome inviável
das madrugadas insones
criação encroada
das linhas não expressas
molha olhos e travesseiro
ah, a cabeça
das ideias mirabola um vespeiro
alquimia wicca
assenta esse coração pandeiro

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Capineiros odontológicos

Eu sou cara de pau, mas dentista é "falta de educação". Eles "capinam roça" nos nossos dentes, pedem para bochechar um fluor que não disfarça o gosto de ferro quando cuspimos sangue na piazinha deles e têm a "cara larga" de avaliar:
- Não foi nada, vai!
- Doutor, saiu sangue da minha boca, como assim?
Ultimamente, só falto perguntar orientação partidária, time e religião antes de marcar consulta. As secretárias não entendem nada:
- Isso é realmente importante?
- Claro! Ele colocará três ferramentas na minha boca e vai disparar aquele falatório carente de sempre deles. Se for malufista, não conseguirei argumentar e terei uma síncope na cadeira.
Lembro de quando trabalhei na ONG Turma do Bem e o presidente fazia um mea culpa de que era uma faculdade elitista e para atender os poucos que pudessem pagar. Seria muito pouco provável encontrar algum de jaleco branco a favor do Bolsa Família. Faço concessões:
- Marco se não falar em temas polêmicos.
Mas também quando eles não abrem a boca dá mais nervoso ainda! É como ginecologista e depiladora antipáticos: começamos a prestar atenção no que estão fazendo e aí fica ainda pior do que o atendimento já é.
Sempre que fico cara a cara com o teto braaaanco dos consultórios deles sugiro (quando posso cuspir):
- Podiam fazer uns grafites no teto, a gente prestava atenção noutras coisas que não esse ziiimmm aflitivo da maquininha.
Trabalhei com uma dentista mexicana que dizia ser uma profissão que já se focava demais num detalhe e quando especializavam, ficavam ainda mais concentrados num pedacinho deste tamanhinho do ser humano. Brinquei com meu dentista sobre isso:
- A gente conta de um colega que cruzou a América de moto e vocês querem saber quantas cilindradas ela tinha.
Passo no terceiro em pouco tempo, para levantar orçamentos igual as empresas fazem com gastos altos inevitáveis.
- Então, tem que fazer uma coroa e...
- Dá licença, vou vender meu rim e já volto para fechar o tratamento.
- Não exagere vai!
- Vocês fazem carnê de tratamento dentário igual das Casas Bahia?
- Não sei quanto fica, vão te ligar. - ai dentista pião. Não sei o que é pior, tomar o susto deitada ou ser pega de surpresa depois na calada de uma distração qualquer, para depois sabermos que tem que hipotecar a casa e fechar os buracos da boca.
- Pô se tivesse uns solteiros para fazer escambo por favores sexuais...
Meu pai quer socar a revista da sala de espera em mim e tenho que avisar que é brincadeira.
- Do outro lado não moça, é um pouco menos.
Ele faz uma longa e didática explicação sobre a força que incide nos molares, a reação do dente, as quebraduras, como alimento mole tira os rachados de lugar. Lembro de uma professora ótima de física do ensino médio.
- Acho que já que chama coroa, devíamos fazer uma cerimônia, um ritual: adeus saldo bancário! O que acha doutor?
Ele se diverte. Devia negociar risadas por descontos.
Minha chefe até arrumou um mais barato, mas tem que pegar um jegue, um cipó e uma jangada para chegar lá.
Tenho ATM, ou seja, forço o maxilar dormindo. É difícil abrir a boca na cadeira deles: ela já é meio travada. Com os bonitões, ela se abre meio caindo o queixo, facilita.
Precisava descobrir o esquema de venda de óvulo da colega duma vizinha, daí dá para arrumar a boca, mas é meio debaixo dos panos, nada oficial. Catzo.
Não à toa a maioria dos brazucas tem boca zoada e quando brinco que se o pretê tiver emprego e dente já está de bom tamanho, meu primo diz que limo meio Brasil com estes pré requisitos.
Durmo com a placa sambando na boca e torcendo para esta noite a dita cuja não amanhecer longe da boca e eu com maxilar travado amanhã. Santa Apolônia, padroeira dos doutores do ziiimm, valei-me!

quarta-feira, 2 de julho de 2014

ET na Copa

Os jogos começam e eu pareço vir de Plutão. Não, não vi o passe do meia do Cuzuquistão. Ah é, o goleiro da Malásia era uma graça? Não faço ideia qual foi o placar entre o Nepal e o Quirquistão. Queria mesmo era fazer parte do protesto online Vai ter Cópula. Mas como diz a tia da minha prima "recebemos currículos, fizemos dinâmicas de grupos e... não tinham o perfil". Daí no primeiro jogo fui militar na casa da professora de canto:
- Croácia! Croácia!
Mas lá para as tantas fui arrebatada... Pelas pernas dos jogadores. Que Marcelo é aquele cambada? Ah, ele fez gol contra? Hum...
Nunca pintei a rua, coloquei bandeirinha, colori muro. Na melhor das hipóteses tive figurinhas dos jogadores da Suécia, que eram uma graaaaça, há muitos anos atrás. Mas nesta temporada, é como se trocasse de planeta me mantendo na Terra mesmo. Um dos poucos assuntos que não tenho um mísero comentário a fazer, junto com as "editorias" carros antigos e motos. Fico lá ouvindo e enfiando o pé na jaca em algum vinho ou cerveja escura, para acordar "corta pulsos" no dia seguinte.
No último jogo também, estava com boleiros da zona leste e fiz uma social nos bares do Itaquerão, já que meu bolso não comportava ingressos na Arena e na educação não rolam "jabás" generosos como no jornalismo. Estranhei a comemoração europeia da Holanda: umas palmazinhas e pronto. Num dos gols na partida do Brasil também fui abduzida e comemorei. Não lembro o nível de álcool que foi necessário.
Cadernos de esporte sempre foram os que pulava, colocava na gaiola dos pássaros do meu pai ou usava de "banheiro" pro meu filho canino, o Bidu. Sempre "torci" fazendo pipoca da cozinha: basta acompanhar o ritmo da locução que quando fica mais exaltada, é batata: posso ir para a sala e rever o lance do gol um "porrilhão" de vezes, ouvir as análises - todo mundo é comentarista nato de "futibas", uma pena esse monopólio dos Galvão Bueno de sempre.
Trata-se de um talento para torcer não alimentado. Sou corinthiana não praticante: na barriga da minha mãe acompanhei ela pular quando o Timão levou um título e acabou com um "jejum" que se não me engano já durava 25 anos. Pois bem, quando ela parou de pular, eu comecei e a dona Lu passou mal. Ao nascer, meu pai comprou uma blusinha do Corínthians antes de saber meu sexo. Mas nunca me levou em estádio, oras, como podia me tornar "Gaviões" roxa? Só ano passado que colegas de trampo me levaram para ver Ponte Preta com uns argentinos no Pacaembu e gamei: é um esporte que faz sentido no estádio. Muito embora seja mais batuqueira que torcedora e só não me rendi ao ziriguidum dos hermanos por medo de sair alguma briga e estar longe dos meus acompanhantes.
Chutando pau na barraca recentemente, no último jogo me rendi ao atraso de sono e capotei. Sonhei com olas, ouvindo a vizinhança torcer enlouquecida. No próximo também estou curiosa pra conferir o movimento na Vila Madalena, que está caindo nas graças da "gringaiada", mas...com quem jogaremos mesmo?
Me sinto na pele da eterna incompreendida, quando ouço: "mas nem na Copa"?, ao confessar que não consegui cair de amores pelo esporte mais passional do País, parece quando recuso carne por ser vegetariana e tenho que ouvir: "nem peixe"?