Ver os militantes mais xiitas cutucando os caretas via
Internet com as imagens de coxinhas cheias de plaquinha reivindicando o
supérfluo rendia risadas e uma certeza meio petulante de não fazer parte
daquele universo: imagine, politizada de carteirinha, estudei com a filha do
Lula, tive pai sindicalista, morei a vida toda ao lado do Heliópolis, não estou
aí nessa “fornada gordurosa” gravitando em torno do próprio umbigo. E ainda
tinha feito jornalismo para mudar o mundo: pausa para gargalhadas.
Recentemente passando uma tarde com amigos de histórico
escolar em colégios públicos, um que me considera desertora por ter migrado da
escola estadual para a particular, fico com o rabinho entre as pernas quando
brincam:
- Você podia ter sido uma baita coxinha nascendo em São
Caetano, mas caiu na casa dum sindicalista, olha que carma bom!
Há quase uma semana venho refletindo nessa bipolarização
política da direita e esquerda extremistas. Os menos exaltados também acreditam
aqueles que se veem politizadíssimos mas enxergam uma revolução nestes países
em que a queda do antigo poder acarretou uma perseguição aos dialetos regionais
tradicionais uma espécie de “ursinhos carinhosos vermelhos”.
Fui admitindo minhas falhas nos últimos tempos: antigamente
qualquer começo de papo político significada para mim uma subida ao palanque
que tenho na garganta e uma prosa de varar madrugadas. Quando o PT deu uma
flexibilizada, como não agüentava mais ouvir os colegas apontar o dedão no
rosto e acusar: “e agora esquerda, vai defender o que”? E fui usando a técnica
de uma tia, mudando de assunto até brochar com essas conversas. Daí retomo
contato com quem não parou a militância, seja virtual ou pessoalmente. Admito:
sou meio coxinha ursinhos carinhosos.
Uma vez recebi em casa uma parceira de trabalho da maior
favela de São Paulo, por proteção mesmo e depois soube que quando ela dizia
onde estava morando os vizinhos do Heliópolis consideravam que ela “tinha
virado boy”. É dentro deste bairro, num condomínio de 48 prédios cheio de
árvores, parque para criança e terceira idade, sou meio privilegiada. Ah, uma
coxinha vegetariana meio fantástico mundo de Bob, vá!
Durante muito tempo fui viciada nesses cafés com canela,
chantili, tanta coisa que meu pai acusava:
- Isso aí já é uma torta!
Mudando da comunicação pra educação vi que era uma esfregada
desnecessária de dinheiro na parece: minha amiga que limpa aqui em casa traz
uma misturinha idêntica aos melhores capuccinos da cidade. Semi coxinha
gourmet,digamos... A paixão pelos naturebas preço único ou por prato também não
colabora. Coxinha aspirante a vegana.
Domar cabelo poim oim oim: não vem dizer que quem tem cabelo
liso sabe o que é “bad hair Day”, isso é coisa de quem dorme com o dito cujo
lindamente enrolado e acorda meio Medusa, esticados, chapados ou tobogãs de
nascença nem sabem do que se trata. Até assentamos com um hidratante e óleo de
ponta simples, mas o ativador de cachos precisa ser contrabando de
profissional, produto de salão, para nos sentirmos fazendo propaganda de
produtos para cacheados. Coxinha peruete.
Adoro o forró e samba aqui da comunidade ao lado, mas fico
sem graça de atravessar meia dúzia de ruas e ir lá dançar com eles, não sei, ia
com o ex mano e dá uma rara timidez de chegar assim na cara larga. Coxinha me
engana que sou tímida.
Amo roupinhas meio alternativas, estilo novos estilistas da
feirinha do Center 3 de domingo na Paulista, praça Benedito Calixto e por aí
vai. Nada muito acessível. A sorte é ganhar muito disso das tia e prima
generosas, de bom gosto e consumistas. Coxinha estilosa.
Ah, mas tem uma militância no Movimento das Mulheres do
Heliópolis, uma circulação pelas peças do Sesc, Centro Cultural e Sesi, filmes
da sessão popular do Frei Caneca, inexplicável conexão ancestral com centros de
umbanda e candomblé, sangria desatada por trilha, cachoeira em quebrada
escondidinha na natureza, tara por brechós... Empate técnico!
Sei não, estou mais para bolinho de queijo heim? Combina até com essas espinhas retardatárias de pele oleosa...